quarta-feira, 30 de julho de 2008

Apagão

Apagão
Eu quase nasci dentro de um avião. O meu primeiro vôo foi com vinte dias de nascido. Como o meu pai era militar da FAB, na minha infância eu sempre morei nas casas das vilas militares, quase sempre, muito próximas dos aeroportos. Muito cedo, aprendi a diferenciar os ruídos dos motores (a hélice) e, consequentemente , o avião que me sobrevoava, mesmo sem tê-lo visto ainda. Mesmo um “rato-de-aeroporto” como eu, voando há 49 anos, comete os seus deslizes. Outro dia eu tinha um show para fazer em Marabá, o lançamento dos meus queridos amigos Dauro e Nevílton, com a participação do Nilson Chaves e com a direção musical do Adelbert Carneiro. O Nilson me encaminhou o email da agência de viagens com os horários de partida e chegada . Na correria que eu estava, fazendo muitos shows, trabalhando muito, dei uma olhada rápida e fixei na memória a data e o horário de 06:20 h. No dia, eu marquei com o motorista que sempre me transporta para o aeroporto, cerca de uma hora e trinta minutos antes do horário prevista para a decolagem. Eu teria tempo mais que suficiente, e além disso, levava só uma pequena mochila como bagagem de mão, o que facilitaria mais ainda as coisas.Despertei uns quinze minutos antes do horário marcado com o motorista e me vesti. Como o tempo sobrando (eu achava) resolvi dar uma olhada nos emails. Para o meu desespero, constei que 06:20h era o horário previsto para a chegada do vôo em Marabá... logo, eu estava muito próximo de perdê-lo. Nem desliguei o computador, peguei a minha mochila e desci a escada do meu prédio correndo. O motorista vinha chegando. A ordem foi seca: “Tu tens 10 minuto para chegar no aeroporto. Voa! “ A tradicional conversa que eu sempre tinha com o Hélio, o amigo motorista transformou-se num quase silêncio, quebrado apenas pelo ruído do motor e dos pneus do Fiat 1.0 em disparada pela cidade. Os segundos se esvaiam... Chegamos ao aeroporto em exatos 13 minutos, muito abaixo do tempo que fazíamos normalmente. Adentrei arfante o saguão do Aeroporto internacional de Val-de-Cães, vi que não havia mais fila no check-in da Gol. Faltavam 13 minutos (ê Zagalo...) para o horário da previsto da decolagem, por um momento eu até pensei que estava com sorte. A atendente foi taxativa: “a aeronave já está fechada. O senhor Perdeu o seu vôo, o nosso próximo vôo é amanhã no mesmo horário, por favor, chegue com uma hora de antecedência!” Aquilo caiu como um balde de água fria (e pedras de gelo) na minha cabeça, não tinha mais jeito, pelo menos naquela companhia. Eu sabia que a Tam tinha um vôo para Marabá no inicio da tarde.Lembrei que eu tinha uma solicitação de bilhete emitido com a milha milhagem da para São Paulo, que eu não havia voado. Corri para a loja da Tam para tentar reverter o trecho. Sem acordo também. “ Qualquer solicitação beneficiada por milhas acumuladas deve ser com uma semana de antecedência, o sistema não aceita...” Não havia mais nada a ser feito, a não ser , voltar para casa e ligar pro meu contratante, explicar o vacilo pedir para que a agência dele tentasse me colocar no vôo da tarde. Nessas alturas, ou melhor, ainda em terra, eu não consegui mais dormir, esperando uma confirmação da vaga pro vôo da tarde, que finalmente aconteceu próximo da 11:00 da manhã. No mesmo instante, passei a mão na mochila e fui para a parada do ônibus. Eu já havia gastado a minha cota de dinheiro de táxi para aquele dia. Mesmo com toda a demora do ônibus, cheguei no tempo certono aeroporto. Terminado o check-in, eu ouvi o meu vôo sendo chamado para o portão 2. Terminei o meu café e gastei os três minutos de sempre para pitar um cigarrinho do lado de fora do aeroporto. Novamente, ouvi o chamado do meu vôo para o portão 2. Subi, e fiz toda a rotina que já me é bastante familiar. Apresentei o meu cartão de embarque para o atendente, ele o olhou, destacou uma parte e me entregou a outra e me apontou o finger que me levava ao avião. Como sempre, fui recebido com aqueles sorrisos de plástico que os atendentes de vôo têm que usar. O avião estava totalmente lotado. Restava um único lugar, o 25 A, na janela, o meu, é claro. Sentei, peguei as minhas balinhas e a minha revistinha e comecei a folhear. Mal eu achei uma matéria interessante, a voz do comandante irrompe no sistema de auto-falantes: “ Tripulação, portas em automático. Senhores passageiros, aqui vos fala o comandante Fulano. Nosso tempo de vôo até Macapá será de 38 minutos”. Esse cara ta maluco, eu comentei em voz baixa. Tem voado tanto que está confundindo as cidades. O gordinho que sentava ao meu lado, e que havia ficado muito frustrado quando eu ocupei a poltrona da na janela , levou alguns segundos se debatendo com a consciência dele e então me falou: Amigo, esse vôo vai para Macapá. Esse vôo vai para Macapá, perguntei eu em voz alta. Metade do avião respondeu: Vai para Macapá! Puta-que-pariu, foi só o que eu pude responder. Passei a mão na mochila e corri desesperado para a porta da frente, que já estava obviamente trancada. Moça - me embarcaram no vôo errado. Eu tenho que ir para Marabá, não Macapá. Ela então respondeu: “Sinto muito senhor agora não tem mais jeito o avião já está trancado”. A adrenalina subiu e eu fui muito enfático (pra não dizer, muito grosso) Vocês me embarcaram no vôo errado. Nós ainda estamos em terra. Resolvam! Nervosa ela empurrou a porta da cabine do comandante, que estava semi aberta e explicou pra ele que havia um passageiro embarcado errado. Ele simplesmente respondeu: , O finger desatracou, O avião já está fechado , Não pode! Foi então, que com toda a finesse que aprendi no bairro do Jurunas, eu empurrei a porta e em português muito alto e claro eu retruquei: “Não pode um caralho! Vocês me embarcaram no vôo errado, eu tenho um compromisso muito importante em outra cidade, a aeronave ainda está no solo e você vem me dizer que não pode? Tá ficando louco? Nisso, a comissária, nervosa tenta me deter e diz: “senhor é proibido invadir a cabine do comandante...” enquanto isso ele (o comandante) e também o co-piloto, falavam no rádio, quando eu vi passar uma aeronave da Tam na nossa frente. A adrenalina subiu mais um pouco e eu fui mais veemente ainda: “Fala aí pelo rádio, pra aquele puto me esperar. Esse deve ser o meu vôo para Marabá e a sua companhia me embarcou errado. Tem obrigação de resolver”... Ele virou novamente a cabeça pra frente e continuou a falar no rádio umas coisa que eu não pude compreender. Por um instante eu pensei que iria sair preso daquele avião por ter “dado alteração”. No meio da confusão sentimos um tranco. Era o finger atracando novamente. Finalmente e pude sair e um funcionário de terra da companhia me encaminhou para o embarque correto. Quando eu passei pelo funcionário da porta ele tentou pegar o que restava do meu cartão de embarque para destacar um pedaço e novamente ele conseguiu trazer a tona a parte mais polida da minha educação jurunense: “Tu já destacaste, pateta e ainda me colocaste no avião errado. Presta atenção no teu serviço, rapaz”! Liguei para a minha mulher para desabafar sobre o ocorrido e ela achou que aquilo era um mau presságio, que eu não deveria embarcar... Finalmente, o vôo das treze horas e pouco decolou para Marabá. Ao chegar lá, pude constatar que o sistema de som no qual eu iria trabalhar era um mix de coisas muito ruins com algumas coisas boas, e para completar, o funcionário que sabia ligar tudo, havia faltado ao serviço naquele dia. Era o começo de mais uma guerra... eu nem tive tempo de almoçar, mas tudo bem: O show foi um sucesso e eu pude cumprir o meu compromisso com o contratante.

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